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11 de jun. de 2011

Os grandes detetives: quando cai o pano sobre o problema final... - Parte 2: a volta do abismo

E agora, John Watson?

O que fazer sem o ultimate bromance da literatura de mistério? Não há mais razão para viver!

The Great Hiatus (O Grande Hiato)

The Final Problem ambienta-se em 1891, mas foi publicado em 1893. Oito anos de pressão pública levam Conan Doyle a lançar, em 1901, o maior clássico do detetive inglês: "The Hound of the Baskervilles" (O Cão dos Baskervilles), sem menção à morte de Holmes. Especula-se que a história se passou em 1889, embora a história devesse se passar antes de 1891, ano da morte de Sherlock Holmes. O público não se deu por satisfeito, e dois anos depois Conan Doyle ressuscitou seu morto.

Isso mesmo, Arthur. Mãos à obra, pode voltar a escrever Sherlock Holmes!

Sherlock The Gray? - The Empty House

Voltar da morte não é um artifício inédito para heróis da ficção (vide Jesus, Goku, Gandalf...), mas é obrigatório que a "ressurreição" seja plausível, coerente com a história anterior e com o personagem, enfim, que seja facilmente "engolível" pelo público.

Se eu acho que a história da volta de Holmes é plausível? Sim, acho. Mais tarde chegaremos aos poréns...

"A Casa Vazia", que na adolescência era uma de minhas histórias favoritas de Holmes (provavelmente mais pelo que representava), primeiro conto do volume "The Return of Sherlock Holmes", tem a data estabelecida logo na primeira linha: 1894. Começa com o relato melancólico de Watson de seu interesse por notícias criminais que o levou a acompanhar o caso do assassinato misterioso do jovem Ronald Adair, e lamenta-se o doutor da ausência da "mente alerta" do principal combatente do crime na Europa, o qual, segundo Watson, certamente se interessaria pelo caso Ronald Adair.

Considero que a solução encontrada pela série televisiva Granada foi interessantíssima: Watson teria se tornado médico legista após o desaparecimento de Holmes, como forma de continuar convivendo com o mundo que antes compartilhava com o amigo. Aliás, na terceira temporada da série, que começa com esse episódio, temos um novo Watson, agora interpretado por Edward Hardwicke (substituindo David Burke). Gostei do Watson de Hardwicke mais que do de Burke, embora ele pareça ainda mais velho do que Holmes (nem é verdade: descobri que Brett, Burke e Hardwicke tinham quase a mesma idade! Brett parecia mais novo...). Aliás Edward Hardwicke faleceu este ano, dia 16 de maio, e também esteve na série Agatha Christie's Poirot, episódio The Hollow (era sir Henry Angkatell).

Jeremy Brett como Holmes e Edward Hardwicke como Watson: Brett não parece mesmo mais jovem?

É claro que todos já esperavam rever Holmes, então a aparição do velho livreiro encurvado de suíças brancas é logo suspeita. Holmes é um mestre dos disfarces! Contudo, a meu ver, como o retorno já era esperado aqui, o efeito do disfarce do clérigo italiano no vagão de trem de The Final Problem, por exemplo, tem muito mais impacto do que o do velho colecionador de livros.

"Eis-me aqui, brô!" (deixa para o desmaio do doutor)

Aí vem o trecho mais importante da história: a explicação de Holmes para o seu sumiço. Como escapou da queda (uma vez que, nos livros, fica bem relatado que Watson procurou pegadas na beirada do abismo e só encontrou dois pares que chegavam até a beira e não voltavam), por que se fingiu de morto, onde estava e por que voltou agora. Nada disso tem muito a ver com o assassinato de Ronald Adair, mas ninguém questiona que a única razão de ser de A Casa Vazia é ressuscitar Holmes, então este é sem dúvida o pedaço mais importante da história.

E eu considero plausíveis as explicações de Holmes sobre como conseguiu sobreviver à luta com Moriarty (e só o vilão caiu no precipício) graças a seus conhecimentos da luta japonesa baritsu e como pôde se safar daquele local sem voltar sobre suas pegadas, escalando parte de montanha. Holmes é ágil, atlético, tem excelente condicionamento físico, luta muito bem. Concordo com Holmes que, se era preciso se fingir de morto, era melhor que Watson acreditasse nisso, e tudo mais. A questão é a razão, esse outro novo vilão. Digamos que eu acho que a carta da criação de um grande vilão para explicar uma grande reviravolta na biografia de Holmes já tinha sido usada, e com maestria, para matá-lo. Por isso já não tem grande impacto para ressuscitá-lo! Sebastian Moran não se vende tão bem como vilão, só por ser o "segundo", e ninguém espera que Holmes tenha medo do "segundo melhor" (ou pior, né?). Usar o mesmo artifício duas vezes seguidas foi o que desvalorizou o próprio artifício, embora não chamusque a reputação de Moriarty como vilão, claro.

Será que chamusca a reputação de Sherlock Holmes?

Não sei. Só sei que o que o público queria foi feito: ele estava de volta. E a cena de tocaia na casa vazia é muito boa, tensa, bem escrita. No geral ainda gosto muito desse conto, por ser tão marcante. Mas Sebastian Moran não me convence mais que outros vilões que o antecederam...

"The empty house is my tree and you are my tiger." (Sherlock Holmes, em The Empty House)